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Pedi um vinho no restaurante, e agora?


Já disse para vocês que aqui no Brasil é normal as pessoas acreditarem que o vinho é uma bebida sofisticada, que, diferentemente da cerveja, não foi feita para ser bebida no dia a dia. Que para ser desfrutada é necessário todo um treinamento. Eu mesmo, quando comecei a me interessar pelo mundo do vinho era influenciado por esse tipo de pensamento e me sentia bem acanhado em algumas situações, por “não saber” como me comportar. Por exemplo, ficava super desconcertado quando pedia um vinhozinho nos restaurantes e os sommeliers vinham com várias formalidades que eu não sabia exatamente para que serviam, e muitas vezes não eram autoexplicativas. Gente, a primeira vez que um sommelier me entregou uma rolha para eu analisar, eu não tinha a menor ideia do que fazer com ela. Eu devia olhá-la, cheirá-la ou ela era apenas um souvenir? Imaginou a cena? Então, para que ninguém mais passe por esse tipo de aperto, decidi fazer esse texto.


De antemão faço questão de deixar claro que os procedimentos que os sommelieres cumprem ao servir um vinho (geralmente) tem alguma explicação técnica, não são apenas firulas, mas nem sempre eles se preocupam em explicá-los aos clientes. Por isso, vou tentar deixar tudo bem claro para vocês, passo a passo.


Ao trazer o vinho, a primeira coisa que o sommelier faz (ou deveria fazer) é mostrar o rótulo do vinho para quem o pediu. Ele não faz isso para que o cliente tire uma foto e poste no Instagram (mas se fizer isso, não deixe de marcar o @vinhosdodia), e, sim, para que verifique se o rótulo corresponde de fato ao que foi pedido. Isso é necessário porque imagine a situação em que ao apontar o dedo para um vinho da carta, o cliente acha que escolheu o vinho Almadén (que custa uns R$20,00) e o sommelier entende que foi escolhido o Almaviva (que custa a bagatela de R$ 900,00). Então, o vinho que foi escolhido deve sempre ser confirmado antes de aberto, porque depois não adianta chorar sobre o “vinho derramado”.


Em seguida, o sommelier retira a rolha da garrafa e, ao extraí-la, faz uma análise visual para verificar se a ela está encharcada ou ressecada. Mas qual seria a consequência disso? Caso aconteça, pode ser um indicativo de vazamento do vinho (se a rolha estiver encharcada) ou de entrada de ar na garrafa (no caso do ressecamento) provocando uma possível oxidação, e deixando o vinho “avinagrado”. Logo em seguida o sommelier também faz uma análise olfativa da rolha. E diferentemente do que muitos pensam, esse ato de cheirar a rolha não é para sentir aromas dos vinhos, e sim para tentar identificar se ele está contaminado por uma substância química chamada tricloroanisol, ou TCA. Cerca de 5% das rolhas de cortiça são contaminadas pelo TCA, ou seja, em média, a cada 20 vinhos 1 pode ter esse defeito. O cheiro que a rolha tem nesse caso é de mofo e dizemos que o vinho está bouchonné (expressão francesa que vem da palavra bouchon – rolha). A pessoa que está servindo o vinho costuma passar a rolha para aquele que pediu a bebida também possa verificar essas possíveis contaminações, mas não é obrigatório que você também faça essa análise. Afinal, geralmente o sommelier terá mais experiência que você para identificar esses problemas.


Cumprida essa etapa, chegou o grande momento: o vinho será servido. O sommelier então colocará vinho na taça da pessoa que pediu o vinho, mas perceba que será apenas uma pequena porção. Nesse momento o ideal é não gastar um tempão fazendo uma análise técnico-gustativa detalhada do vinho (algumas pessoas pensam que devem desvendar todos aromas e sabores nesse momento). O objetivo aqui é que você verifique o estado que a bebida se encontra, ou seja, se ela tem algum problema ou não. Não estranhe se o sommelier se servir com um pouquinho do vinho e também experimentá-lo para que ele próprio verifique sua condição. Isso é relativamente comum.


Mas então, Thiago, o que devo analisar no vinho neste momento? O primeiro ponto que deve ser observado é bem simples, a temperatura da bebida. Veja se o vinho está na temperatura ideal e, caso não esteja, peça para quem estiver servindo o resfrie. Se o vinho estiver gelado demais, nesse caso recomendo apenas deixa-lo na mesa que a Física (em particular a termodinâmica) com o passar do tempo fará o trabalho de aquecer o vinho para você.


Além da temperatura, deve-se também verificar se o vinho está saudável. Caso ele tenha algum aroma de papelão molhado (vinho contaminado por TCA, “bouchonné”), vinagre (vinho oxidado) ou ovo podre (vinho contaminado com Sulfeto de Hidrogênio) deve-se avisar ao sommelier e pedir para ele trocar a garrafa. Sim, essas coisas podem acontecer, mas geralmente o sommelier ao comprovar o defeito, não se opõe à devolução da garrafa. Recomendo que se isso acontecer, escolha outro rótulo, pois apesar de o problema poder estar restrito à garrafa servida, pode acontecer também de ser algo comum a todo o lote. Apenas evite escolher um vinho com valor muito menor para não parecer que houve algum arrependimento na primeira escolha devido ao preço (hehehe).


Se o vinho não apresentar nenhum defeito, o sommelier então irá servir as outras pessoas da mesa, sempre começando pelas mulheres, depois os homens e, por último, a pessoa que pediu o vinho (sim, é isso mesmo, você pede o vinho mas é o último a ser servido, rsrs). Repare que caso tenha sido pedida apenas uma garrafa, o sommelier irá dividi-la igualmente entre todos que estiverem à mesa. Então, para que não fique uma porção muito pequena para cada um, no caso de haver mais de seis pessoas, peça uma segunda garrafa. Uma vez estive em um jantar em que a situação foi um pouco constrangedora, a quantidade de vinho servida só deu para cada um dar um golezinho. Fiquei super sem graça. Aí, quando cheguei em casa “fui obrigado” a abrir uma garrafa só para matar a vontade.


Quando a primeira garrafa terminar provavelmente o sommelier lhe oferecerá mais uma. Caso o pessoal da mesa esteja animadinho e a resposta seja sim, ele trará uma nova e todo esse ritual será realizado novamente. Ah, já ia esquecendo ... geralmente quando o primeiro vinho é branco e o segundo é tinto, peça para que as taças sejam trocadas.


Pessoal, caso tenham alguma dúvida, comentário ou queiram compartilhar uma experiência sua pedindo vinho em restaurante não deixem de escrever aqui ou marcar o @VinhosdoDia nas suas redes sociais.

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